Nem tudo o que é imponente é arrogante. Nem tudo o que é despojado é pobre. E nem tudo o que é esquecido é desprovido de valor. Itália Brutalista. A Arte do Concreto, a nova exposição promovida pelo Istituto Italiano di Cultura do Rio de Janeiro, em cartaz no Polo Cultural ItalianoRio, devolve voz, dignidade e força simbólica a uma linguagem arquitetônica por muito tempo incompreendida: o brutalismo.
O termo brutalismo nasce no pós-guerra a partir de uma provocação semântica: béton brut, o concreto bruto valorizado por Le Corbusier, tornou-se a base de uma estética que rejeita ornamentos e reivindica a autenticidade dos materiais e a honestidade estrutural como valores éticos. Como escreveu Reyner Banham, historiador e crítico radical da arquitetura do século XX, em seu célebre ensaio The New Brutalism, o brutalismo é menos um estilo e mais uma ética – uma maneira de projetar que revela, sem concessões, estrutura, função e material.
É na Itália, contudo, que essa linguagem adquire um caráter singular. Em um país atravessado por memórias milenares, as obras brutalistas não representam apenas um futuro a ser construído, mas também um passado a ser incorporado, reelaborado, talvez até redimido. Como observa Adrian Forty, professor emérito da Bartlett School of Architecture de Londres, os arquitetos italianos se diferenciam sobretudo por reconhecer que o concreto pode remeter a mais de uma época, representando simultaneamente o passado e o futuro.
A exposição reúne sessenta imagens extraordinárias dos fotógrafos italianos Roberto Conte e Stefano Perego. Em mais de cinco anos de trabalho, os dois percorreram mais de vinte mil quilômetros de norte a sul da península, documentando obras impressionantes. Suas lentes capturam a força escultural e a carga narrativa de edifícios como a Casa do Portuário de Nápoles, o Santuário de Monte Grisa em Trieste, os prédios conhecidos como ‘Máquinas de Lavar’ em Gênova, o cemitério de Jesi, o Tribunal de Salerno e o Palácio do Trabalho em Turim.
Construções que, em seu tempo, foram manifestos sociais, tentativas de democratização do espaço urbano, respostas arquitetônicas a uma sociedade em mutação. Hoje, essas mesmas obras falam uma língua dura, porém necessária, feita de volumes incisivos, superfícies ásperas, geometrias não conciliadas. Não buscamos a harmonia convencional, mas uma ordem mais profunda, feita de contrastes e tensões, declaravam Alison e Peter Smithson, arquitetos britânicos fundadores do movimento.
O brutalismo italiano deu forma a uma pluralidade de visões: de Giancarlo De Carlo a Vittorio Gregotti, de Gino Valle a Carlo Aymonino, passando por nomes menos conhecidos, mas igualmente radicais. Seu legado, hoje redescoberto internacionalmente, constitui um desafio crítico e poético: como tornar visível o invisível da sociedade? Como construir, de forma literal, os vínculos entre espaço e justiça, entre forma e sentido?
A mostra se apresenta como uma exploração lenta e densa, conduzindo o visitante por uma jornada visual e conceitual. As fotografias, extraídas do livro Brutalist Italy, foram organizadas em um percurso curatorial que oferece contexto, profundidade e densidade histórica.
Mais do que uma exposição, Itália Brutalista. A Arte do Concreto é um convite a ver com outros olhos aquilo que pensávamos já conhecer. A ler no concreto não apenas um material, mas uma escrita. A descobrir, entre geometrias angulosas e superfícies rugosas, o reflexo de uma época que ousou se imaginar eterna. Como afirmou Paul Rudolph, figura central do brutalismo americano, o brutalismo não é uma moda, mas um esforço para devolver à arquitetura o papel de arte responsável e consciente.
Realização:
Istituto Italiano di Cultura do Rio de Janeiro
Apoio Institucional:
Consulado Geral da Itália no Rio de Janeiro
Exposição fotográfica ‘Itália Brutalista. A Arte do Concreto’, no Polo Cultural ItalianoRio
Data: De 4 de julho a 29 agosto de 2025
Horário: De Segunda a sexta-feira, das 7h30 às 16h30
Local: Polo Cultural ItalianoRio – Av. Pres. Antônio Carlos, 40 – Centro, Rio de Janeiro (RJ)
Entrada: Franca